segunda-feira, 9 de maio de 2016

Viver feliz aos 40 (e tais)


Diz o povo que os 40 são os novos 20. Agora, a nova moda é dizer que é aos 50 que se começa a viver, tudo o que antes veio foi apenas um estágio. Até acho que posso acreditar. Mas continuo na minha: não há como os 40, mas também não há como os 30, com a diferença que aos 40 a esmagadora maioria de nós sabe bem, pelo menos, o que não quer. Depois, há aquelas que, mesmo sabendo o que não querem, insistem em aceitar e viver no que não querem, por medo, por comodismo, por masoquismo. E há tantas e tantos por aí que vivem no que não querem. Quase sempre por medo. Por medo de olhar para dentro, por medo de falhar, por medo de sair da zona de conforto, por medo de perder o emprego estável mas chato ou indigno, por medo de saltar de um casamento que, sendo mau sempre é alguma coisa, por medo de viverem sozinhas e perderem as mordomias que dois salários trazem, por medo de serem engolidas pela solidão porque acham que viver sem homem é viver infeliz. Quando não há maior infelicidade que viver sozinho acompanhado.

Eu vivo sem um casamento e vivo (muito) feliz. Com dias em que mais me apetece não sair da cama ou sequer olhar ao espelho, com dias em que a ansiedade toma um pouco conta de mim (como acontece a toda a boa gente), mas feliz. Por uma única e principal razão: agora, sim, aos 40, vivo (quase) de acordo com a minha essência, com o que realmente quero e afasto sem culpa ou medos o que não quero. E os 40, com todas as mazelas que trazem (a gravidade, os filhos mais crescidos, o corpo a dar de si, o tempo a ficar mais curto), são, de facto, uma idade de ouro para quem souber fazer o caminho interior certo para lá chegar. Sim, porque não basta fazer 40 e catrapuz...num segundo ficamos em paz ou mais sábias ou mais maduras. Nada disso. Há uma viagem para fazer que muitos a evitam porque dói. É a viagem interior, até ao nosso centro, até à nossa essência.

O que gostamos, de facto? O que queremos, de facto? O que não queremos, de facto? Que sonhos temos? Como queremos viver o dia-a-dia? Que medos me estão a prejudicar? Que defeitos me estão a afastar de mim e dos outros? Esta é, para mim, a principal viagem da nossa vida, a viagem ao nosso interior. Foi a viagem que iniciei há muitos anos e que começou a dar frutos, precisamente, à beira dos 40. Por isso, acabei com um casamento que nada tinha a ver com a minha essência, abdiquei do conforto material para ter equilíbrio e coerência emocional, parti na aventura de educar uma filha com os valores da igualdade, fraternidade e liberdade, fui ficando cada vez mais feliz e mais conectada com o meu interior, após anos de dor que se seguiram à separação e que já vinham de anos anteriores. Dei-me ao trabalho de me divorciar para ser mais feliz, porque, acreditem, dá trabalho.

Dei-me ao trabalho de fazer o caminho das pedras para ser mais feliz. Porque, acreditem, dá trabalho. Dei-me ao trabalho de olhar para dentro e exercitar dia após dia a mente, o pensamento, o auto-controlo para ser mais feliz. E, acreditem, dá muito trabalho. Se pensam que a viagem ao interior obtém resultados no dia seguinte, estão à partida a desistir. Demora meses e anos. É um processo de cai-levanta, tenta-erra. Mas é a mais deliciosa viagem de todas. Hoje, sou predominantemente feliz comigo. E isto resume-se a um indicador: vivo de acordo com a minha essência, com o que acredito. Não faço fretes, não aceito pessoas que não sejam para acrescentar e tento em cada decisão e em cada acção colocar o meu amor e a minha sensatez.

Mulheres de 40 (e tais) como eu, que fizeram a tal viagem e estão de bem consigo e com a vida, não estão com alguém só por estar, só por companhia. Estão por muito mais até que uma paixão. Mulheres como eu estão com um companheiro, um parceiro. Ou então, não estão. Porque valem-se a si próprias. Vivo em paz, sem alimentar maus sentimentos, mesmo contra aqueles que me querem mal. Posso ter pouco, posso estar à beira do desemprego, posso viver com dificuldades financeiras (esta parte irrita-me, confesso) mas vivo de acordo com o que acredito ser o bem e sempre a acreditar que posso colocar o melhor de mim no pouco que seja. E que há sempre caminho interior e exterior ainda por fazer porque a vida tem de ser vista como a maior das benções e a felicidade não é algo que se deseja, é algo que se tem. Que se está. A vida tem de ser vivida como achamos que devemos e não como os outros acham que a devemos viver. Caso, contrário, vivemos aprisionadas.

Posso garantir que não há paz maior do que aquela que advém de vivermos em ligação estreita com o que realmente somos e queremos.

segunda-feira, 18 de abril de 2016

Regresso

Andei uma semana desaparecida, muito por causa, como aqui relatei antes, da inesperada morte da cadela da minha irmã, que era para mim uma sobrinha. Foi-se-me o tempo, a vontade e a inspiração. A Améle, era esse o seu nome, era uma cadela reservada e muito doce e a sua partida teve tanto de inesperado, como de revoltante. Sinto que estive a fazer um luto. Na minha família, os animais são gente e sentimos a sua partida como tal. Ainda estamos todos em choque e a habituar-nos a não a ter.

Posto isto, retomo as minhas anotações e crónicas. Entretanto, no meio deste caos, foi publicado o meu primeiro texto na plataforma feminista Capazes, que muito me encheu de orgulho e que amanhã já partilharei aqui,

Uma boa noite a todos e a mim também, já agora.

quinta-feira, 7 de abril de 2016

Mas afinal como se pratica o feminismo?


Aqui há uns dias estava eu a trocar argumentos com a juíza conselheira Clara Sottomayor, publicamente, na sua página de Facebook, sobre problemas como a violência doméstica e a alienação parental (que a douta conselheira rejeita e eu alerto que existe, de facto), quando a jurista de reconhecido mérito (e merecido) questiona a minha natureza feminista e o meu activismo. Pergunta-me se eu tenho textos publicados que provem que sou de facto uma feminista. E insiste: mostre-me os seus textos.

Fiquei pasma. E fiquei a pensar naquilo. Fiquei a pensar se só serão feministas as mulheres que tenham publicado textos em órgãos de comunicação social ou em páginas de organizações activistas. Se só serão feministas as mulheres que têm a oportunidade de chegar à Assembleia da República, como deputadas, ou pertencerem a um partido, onde têm um palco para amplificar a sua luta (e ainda bem que o têm e o usam). Questionei-me se só serão feministas aquelas que ocupam lugares nos tribunais e podem, assim, explanar e aplicar a luta pela igualdade de géneros nas suas sentenças ou acórdãos. Que podem, dada a sua mediatização, levar a luta até aos jornais ou elaborarem extensos tratados académicos sobre esta luta tão digna que é a igualdade de géneros, a igualdade de direitos e oportunidades e o fim das sociedades patriarcais.

Conclui após alguma reflexão que as mulheres que têm textos publicados sobre a igualdade de género dão um importantíssimo contributo para esta luta, tão importante que é desejável que mais mulheres consigam e se disponham a ter um palco mediático ou académico para o poderem fazer. Um bem haja a todas essas mulheres que dedicam a sua vida profissional ou parte dela a esta luta. Mas depois também concluí que, a par desta forma de luta, existem milhares e milhares de mulheres anónimas ou menos mediáticas que, à sua maneira e com os instrumentos que têm, também fazem um verdadeiro activismo não institucionalizado, praticando os ideais feministas todos os dias, no seu pequeno universo, na sua própria forma de estar na vida. E não são menos feministas pela simples razão de não terem obra publicada.


A minha amiga Gisela, por exemplo, que vive num bairro um pouco degradado e arranja unhas como ninguém (aplica o gelinho como uma arte, é de verem) e que não teve, por razões diversas, oportunidade de ir além do nono ano pratica o feminismo como poucas. Arrisco até dizer que é a maior feminista da sua rua ou até mesmo do seu bairro. Ela não sabe quem foi Sojourner Truth, que tanto fez pelas mulheres no século XIX, ela também nunca ouviu falar de Ana Castro Osório, de Maria Lamas ou de Adelaide Cabete. Mas eu garanto-vos que na vida dela, desde miúda, foi uma activista feminista na sua rua, no seu cabeleireiro, na gestão da sua própria vida.

Foi feminista quando no café lá do bairro dizia às mulheres para não aceitarem ser menorizadas pelos maridos (fazia verdadeiros comícios), foi feminista quando na fábrica onde trabalhou antes de arranjar unhas foi falar com o patrão e, corajosamente, lhe perguntou porque razão ganhava menos que o colega Alberto se fazia trabalho igual, foi feminista quando despachou o marido de casa depois de este ter ousado dar-lhe uma tareia que a levou ao hospital Beatriz Ângelo (mal sabia ela que esta foi uma famosa feminista) para suturar o golpe e depois à esquadra da polícia para apresentar queixa. Foi feminista quando dizia à filha diversas vezes que nunca devia aceitar discriminações, que devia lutar por direitos iguais e combater estigmas. Ou quando ensinava à filha que não havia problema algum em brincar com bolas e carros e ao filho que o gosto dele pelo ballet era tão normal como o do amiguinho da escola pelo futebol.

Tenho muitas dúvidas que a Gisela tenha textos escritos ou obra publicada sobre o feminismo. Acho que, de vez em quando, fazia uns rabiscos num papel (que colava no frigorífico) a avisar o marido que não permitia ser vista como a empregada da casa e que ou ele passava a partilhar tarefas e deixava de ver a casa como obrigação apenas dela ou o caldo podia entornar. Acho que uma vez, estava ela no Porto de férias em casa de uma prima, escreveu uma carta ao marido a explicar-lhe que os tempos mudarem e que não lhe permitia machismos e muito menos violência doméstica porque um casamento era uma parceria para a vida e ambos tinham direitos iguais. A Gisela tem estes rabiscos e esta carta mas eu não sei se a doutora Clara Sottomayor considera que são obra suficiente para fazer dela uma feminista.

Eu acho que ela é a maior feminista da sua rua e tem mudado mentalidades no seu pequeno mundo e no seu microambiente, como poucas. As mulheres lá da rua da Gisela, ou algumas, vá lá, deixaram de se sentir vítimas por serem agredidas pelos maridos, começaram a impor-se e a lutar por respeito e tratamento igual e começaram a vestir-se como gostam sem temerem ser consideradas umas depravadas e levianas. É verdade que muitas das vizinhas pagaram um preço alto e viram o casamento descambar, agora que não assentava numa lógica de poder masculino, mas também houve aquelas que conseguiram obter a compreensão dos companheiros. Foi a nível local, é certo, não teve amplitude nacional, é certo, a Gisela não foi ouvida ou lida por todo o país, é verdade, mas localmente esta esteticista fez a diferença. Na sua vida e na de outras.

E não é localmente, dentro da nossa família, na nossa vida, na educação aos nossos filhos, nos nossos posicionamentos, que todas nós podemos fazer a diferença? Cada uma localmente não ficamos muitas? Não é assim que se pratica o feminismo? Ou será só com textos publicados?

Quanto a mim, bom, sou uma mera jornalista, mulher e mãe. Conheço a história do feminismo, as três vagas que existiram desde o século XIX, estou a par das várias correntes (porque não há um feminismo, há vários), já li bastante sobre as sufragistas e sei quem é Carolina Beatriz Ângelo ou Ana Castro Osório, ou as três Marias, e tenho uns textitos publicados, coisa muito pouca, não será certamente obra de monta, mas sou exactamente como a minha amiga Gisela, aplico os ideias feministas, a luta pela igualdade de géneros desde tenra idade, sempre que opino e me bato contra o poder patriarcal nas sociedades. E, agora, mais importante que tudo, na educação que dou à minha filha.

 

quarta-feira, 6 de abril de 2016

Pedro Arroja está desesperado e a desintegrar-se

Pedro Arroja está desesperado. Representa os resquícios de uma sociedade da idade média que tem vindo, felizmente, a desintegrar-se, mais devagar que o desejável mas sempre a dar passos seguros. E Pedro Arroja anda aflito, a esbracejar, a afundar-se na sua própria mentalidade das cavernas e grita pedidos de ajuda incoerentes e disparatados, sem que alguém, nem os que até alinham com algumas das suas ideias, lhe dê a mão.

Pedro Arroja está desesperado, começa a ver o mundo a andar em frente, as sociedades a elevarem-se e ele, pobre coitado, a ficar isolado numa ilha sem árvores, sem seres vivos, apenas cavernas, areia lamacenta e muitos papões para o atormentarem à noite.

Este senhor aqui em baixo anda perdido, está desorientado com os ganhos da mulher pela igualdade de direitos nas sociedades ocidentais e modernas, pela luta pelo fim das sociedades patriarcais que ano após ano ganha mais adeptos e avança mais uns metros.

 
O rei dos homofóbicos odeia homens homossexuais, odeia mulheres que saem de casa para trabalhar, odeia feministas, odeia mulheres que alcançam sucesso em qualquer área da sua vida, odeia o mundo democrático e livre e, no final de todo este percurso, odeia-se a si próprio. Vive perdido numa sociedade que caminha para a igualdade de géneros, para o respeito pelo próximo, sem olhar a raça e géneros.
 
Depois de ter chamado "esganiçadas" às dirigentes do Bloco de Esquerda por elas serem dirigentes, veio agora mostrar mais um pouco do seu fel cavernoso, escrevendo no seu blogue qualquer coisa como: "A ascensão generalizada de mulheres nas direcções partidárias é um sinal de degenerescência dos partidos". Cada vez que uma mulher chega a um lugar de liderança Pedro Arroja esvai-se em diarreia. Contorce-se em espasmos sofridos e caga-se todo. Desfez-se em diarreia quando Assunção Cristas chegou à liderança do CDS e borrou-se (mentalmente falando) quando Passos escolheu mulheres para a vice-presidência do PSD. Como é que é possível que mulheres cheguem à liderança de organizações políticas? Um lugar natural dos homens. E não aguentou a dor e evacuou de novo, com uma explicação mais ou menos assim: Como os partidos políticos são organizações "sectárias por excelência", descendendo directamente de "seitas protestantes", elevar uma mulher à liderança "é enfraquecer o espírito partidário".
 
Vamos por partes. Arroja até acerta num ponto. Há centenas de anos os partidos nasceram como organizações sectárias, da mesma forma como há centenas de anos as mulheres não tinham direito ao voto, nem sequer a trabalhar fora de casa e em que serem violentadas pelos maridos era visto como normal e aceitável. Não podiam usar calças sem que fossem apelidadas de depravadas e mulheres da vida, não podiam entrar em cafés, não deviam falar de política, não podiam viajar para o estrangeiro sem autorização do seu senhor marido, não podiam ser juízas ou militares. E podia continuar...
 
O que Pedro Arroja -  um economista a quem o Porto Canal dá palco à sua revolta - se esquece é que o mundo mudou, as sociedades mudarem, as tradições mudaram, as leis mudarem, as mentalidades estão a mudar. Como tal, e obviamente, a mudança chegou aos partidos. Claro como a água. E se o "espírito sectário" de que Arroja fala significa que os partidos sejam intolerantes e funcionem como seitas (é o que significa sectário), então, ao dizer que as mulheres, com o seu "espírito comunitário",  vão enfraquecer o sectarismo dos partidos, este economista está sem se aperceber a fazer um elogio ao impacto da subida das mulheres às lideranças. E até merece aplausos. Por tudo isto e muito mais o fim do espírito sectário nas organizações com a liderança das mulheres só pode mesmo ser uma boa notícia.
 
Por isso, mulheres, mulheres que lideram, mulheres que alcançaram a liderança de partidos, mesmo que nos/vos incomode os contantes ataques de Pedro Arrojo, vejam tal diarreia como um rasgado elogio, porque é notável que alguém reconheça que o espírito comunitário das mulheres "enfraquece" o espírito sectário dos homens nos partidos. E pensem: Pedro Arroja está desesperado, a sua alma ficou parada na caverna, o seu espírito vê-se cada vez mais isolado numa ilha lamacenta, escura e pejada de fantasmas. Há que perdoar e tentar ajudar, recomendando uma minuciosa terapia, acompanhada de soro para a desidratação. É que, dado que cada vez são mais as mulheres que chegam a lugares de topo nos partidos, Arroja arrisca-se a uma desintegração por tanta evacuação.
   
 

terça-feira, 5 de abril de 2016

Hoje é que é!

Quantos de nós já não disse esta frase uma montanha de vezes? Hoje é que é! É hoje que vou começar a fazer aqueles exercícios para combater esta 'pneu' dos 40 (e tais), é hoje que vou substituir aquela maldita batata frita por um abacate diário ou por um belo prato de espinafres salteados (e que bons que são).

É hoje, é hoje, é hoje mas nunca é. Ganha sempre o sofá nesta guerra titânica ou ganha sempre aquela-ida-à-esplanada que está mesmo, mesmo a chamar por nós. E o hoje lá passa para amanhã. "Amanhã é um bom dia", sussurra o Tico para o Teco. "Amanhã, tens uma agenda mais livre, não há almoço da miúda, o trabalho é mais ligeiro, não há café com amigas ou situações inesperadas que arrastam para depois 10 das 15 tarefas que tens planificadas na agenda", insiste o Tico, para convencer o Teco.

Já chega! É mesmo amanhã. Amanhã, 'bora lá acordar bem cedinho e fazer os exercícios que se podem ver aqui em baixo.



 
Isto nem me parece nada difícil. Estica uma perna para trás, agacha o rabo, flexiona as pernas e estica a barriga. E já está. Garantem os profissionais destas coisas que se vai o 'pneu' dos 40 (e tais) e que ficamos uma verdadeira Top Model (sim, sim...). Não vai num ápice, de certeza, que eu aqui não sou tonta ao pensar que isto é tudo fácil e como a 'bimby'. Ah...mas vai, tem mesmo de ir.
 
E é já amanhã que começo. Eu já tinha dito que seria a 1 de Abril mas uma fatalidade que passou como um furacão na família deixou-me sem tempo (e disposição). Depois a miúda ficou doentinha e lá se foram os planos (e as promessas).  
 
Pronto. É amanhã.

Roupas e coisas assim

O look de hoje :-)

sábado, 2 de abril de 2016

Da maldade humana

Não sou uma pessoa de rodeios ou de andar em grandes voltas para chegar ao ponto. Não sou uma pessoa de escrita salpicada de muitos floreados (bem gostava de ter esta arte) para passar uma mensagem. Talvez defeito ou vantagem, sei lá, disto de ser jornalista. Por isso, feita esta introdução (ou será rodeio?) vou ao ponto.

Hoje foi um dia triste. À hora que escrevo - sem dormir há mais de 36 horas - tenho de dizer que ontem foi um dia triste. Um dia marcado pela negligência, falta de respeito e maldade. Cada uma das situações me parecem tão surreais que só acredito nelas porque as vivi.

A cadela da minha irmã morreu. Foi fazer uma simples lavagem aos dentes (com anestesia geral), um processo comum nos cães, e morreu horas depois do Hospital e veterinária terem desvalorizado e ignorado todos os alertas da dona sobre o estado de sofrimento em que a cadela se encontrava, o que para mim é uma grosseira negligência. Morreu, horas depois, já não foram a tempo quando de madrugada voltámos em desespero. Mas vou poupar os detalhes. Esta foi a situação que nos roubou um membro da família num ápice e sem esperarmos (e ver a dor do meu padrasto - que a adoptou como filha - é tão doloroso quanto a ida dela). A falta de respeito está em tudo o que se seguiu. Um muro de silêncio na clínica tão tipicamente português para tentar encobrir o que se passou. Ainda agora, não sabemos o que se passou. Ninguém apareceu, ninguém deu a cara, apesar dos insistentes pedidos da minha irmã para ter uma explicação. Isto será tratado em tribunal.

A história de maldade é a que se segue. Acabados de chegar da terra onde vivem, em desespero porque para todos os efeitos era uma filha/neta que tinha partido (para a minha família os animais são vistos e tratados assim), a minha mãe e o meu padrasto abraçaram-se à minha irmã num choro convulsivo quando ela se encontrava, mais desfalecida que desperta, sentada no primeiro de três degraus que dão acesso ao prédio contíguo à clínica. Foi ali que nos sentámos as duas desde as 6 da manhã para...sei lá...para pensar e viver o momento. Ela estava no degrau rasteiro ao passeio. Quando estamos a viver o reencontro (e todos sabem o despertar de emoções que se gera quando a família se vê pela primeira vez numa morte) chega uma senhora na casa dos 50 anos, hirta, expressão opaca, gélida. Desumana, até. Que dispara:

- Vocês são daqui? São deste prédio?

Como era eu a mais calma no meio daquela dor levantei-me e dirigi-me à senhora convicta que, enfim, era alguma responsável da clínica. Digo-lhe:

- Não, não, somos a família que acabou de saber que a sua cadelinha morreu e...

- Não podem estar aí sentadas. Isso é propriedade privada - atirou a dita, interrompendo-me, de cara gélida, desumana, toda ela hirta, arrogante, sem um pingo de alteração na expressão facial pelo que eu acabara de revelar.

Apanhada de surpresa, por um segundo achei que ela não me tinha ouvido bem. Reitero a notícia da morte, enquanto o meu padrasto, ausente, distante, continuava inconsolável.

- Isso não é uma sala de espera - atira ela, de novo, mais hirta ainda, mais desumana ainda, mais fria ainda, amarga. E continua: vou chamar a polícia.

Foi aqui que me alterei, depois de horas sem dormir, sem comer, a ver a minha irmã sofrer. Percebi na hora que aquela mulher (não vou trata-la por senhora) era simplesmente e profundamente má. Respondo-lhe, então, já fria também, que não só podia chamar a polícia, como seria eu própria a fazê-lo. E avancei para ela, exigindo-lhe que me desse o nome. Não deu. Acobardou-se e entrou de rompante no prédio, cuja porta de entrada fica a uns dois ou três metros do degrau rasteiro ao passeio onde nos encontrávamos.

Nem 10 minutos depois tínhamos junto a nós dois agentes da PSP incrédulos e chocados por repararem que tinham sido chamados a uma ocorrência que mais não era que um casal de mais de 60 anos e uma jovem a chorarem a morte daquele querido membro da família, sentados num pequeno degrau colado à porta da clínica veterinária. Tal era a incredulidade dos agentes que só não subiram ao prédio para inquirirem aquele ser humano (será?) tão ignóbil porque a dita, quando fez a denúncia, nem se identificou. Denunciou "confusão" à porta do seu prédio. A confusão era uma família destroçada num degrau do seu prédio. Os dois agentes da PSP deram-nos os sentimentos, autorizaram-nos a chorar no degrau e, antes de abalarem para, quem sabe, serviços sérios à comunidade, ainda nos disseram que ligássemos para a esquadra caso a mulher (recuso-me a chamá-la de senhora) voltasse a dizer-nos que, naquela situação, um degrau é propriedade privada.

E, além de toda a dor, tivemos de levar no dia de ontem com a mais surreal, feia e rasteira dimensão da maldade humana. Não consigo pensar em ilustração melhor para tal acto gélido e arrogante que a imagem de Jesus Cristo, para que a alma desta mulher possa quem sabe um dia ganhar alguma paz e receber algum amor.

Assusta-me tanto o rumo da humanidade. A maldade que está a tomar conta de tantas pessoas.

     

sexta-feira, 1 de abril de 2016

Mulheres ao leme

Tenho um especial carinho por esta foto. Marca a reunião da família depois de demasiado tempo de uma separação imposta pelas vidas agitadas e distantes geograficamente de cada uma de nós. Marca o dia em que fizemos uma pessoa muito feliz e rumámos todas de surpresa lá para os lados do Alentejo para presentear mais uma primavera da matriarca. Nestes longos anos em que ficámos apenas as quatro após a partida do meu grande-Homem, este foi o dia D desta família de mulheres.
Há um antes e há um depois. Andava por aqui a arrumar o meu álbum digital e encontrei-a. Partilho-a por isso mesmo, porque marca um dia especial em família e, na verdade, a família, com todos os problemas que possa ter, encerrar ou sofrer, é de facto o grande pilar que temos nesta passagem. Partilho-a para homenagear as famílias. A minha também. Uma família de mulheres de garra, não fossemos todas ribatejanas. Já Miguel Esteves Cardoso escrevia numa das suas crónicas:
"O mal da família é a facilidade, é pensar que aquele amor já é um assunto arrumado".

Um beco com saída estreita

 
Em jeito de crónica (1)    Na pele de jornalista    
 
Arranca hoje, em Espinho, o 36º Congresso da família social-democrata. Passos, obviamente, já eleito e sem adversários, vai lá estar para subir ao palco, discursar, e sair consagrado. Consagrado, mas pouco...
O líder do PSD, que até há pouco era o primeiro-ministro do rigor, da austeridade e do resgate e que viu Costa ultrapassa-lo pela esquerda e chegar a São Bento, está numa espécie de beco com pouca saída.
 
No fim do beco há uma passagem tão estreita que só um gato, e dos pequenos, é que por lá passa. Para conseguir furar, o líder dos laranjas vai ter de escavar muito ou usar de toda a sua elasticidade para escalar o muro. Mas terá de suar. Terá de mudar as técnicas de escalada e de jogar-se numa aventura ousada. E ser rápido, muito rápido, porque atrás dele, a virar a esquina e munidos de fatos de homem-aranha, estão outros laranjinhas em passo discreto.
 
Mas Passos não está a conseguir usar novas técnicas de escalada, nem sequer está a escavar o muro. Ficou parado a olhar o obstáculo, repetindo o discurso dos tempos do resgate. Metamorfose não é com ele, o que é de registar pela coerência que tal incapacidade encerra. Mas o partido pede, grita, esbraceja por uma lufada. Só que parece não estar no ADN de Passos tal mutação. Tentou inovar  com a bandeira da social-democracia (que já nem os social-democratas sabem bem o que é), numa derradeira esperança de convencer o muro a jogar-se aos seus pés. Mas o muro está desconfiado. E o tempo corre. E o partido sabe que o tempo até pode correr a seu favor, ou não, que isto da gerigonça até pode ganhar velocidade, mesmo aos trambolhões.
 
E lá vão eles todos para Espinho, resignados ao que têm, resignados a Passos Coelho, às qualidades que todos admitem que tem que e até admiram mas que, questionam, podem não chegar para galgar o beco. Irá Passos surpreender no Congresso? Poucos acreditam. E vão todos ou quase todos lançar olhares discretos para os laranjas que por ali circulam a magicar para os seus botões qual destes pode ser o homem ou a mulher que um dia conseguirá emergir da base e subir até ao palacete onde se senta o chefe do Governo. Será Passos?

quinta-feira, 31 de março de 2016

Testemunho na Notícias Magazine


Há mais de um ano uma amiga jornalista desafiou-me a contar a minha vivência no Natal enquanto mulher divorciada e com uma filha. Fi-lo com gosto e apenas disse que não aceitava nada que tivesse por objectivo passar a ideia de que o Natal é necessariamente um drama para os filhos de pais separados. Aceitei e deixei claro que a minha perspectiva, como quase em tudo, é positiva e que não contribuiria para promover trabalhos que colocassem as crianças como coitadinhas. Não pretendo dourar a pílula e dizer que isto é tudo muito giro e tudo muito igual para as crianças como se os pais fossem casados (ou juntos, tanto faz). Claro que não, claro que é diferente e claro que há crianças que sofrem todo o ano e talvez mais nesta quadra. Mas o que tentei dizer neste meu testemunho à http://www.noticiasmagazine.pt é que se essas crianças sofrem mais que a conta durante todo o ano na sequência de uma separação e mais ainda no Natal é porque os adultos estão a fazer algo muito errado na gestão dessa separação.
 
Não há volta a dar: se os pais dramatizam, as crianças dramatizam. Se os pais se mostram serenos e agem com normalidade e amor, as crianças sentem-se seguras.
 
As crianças só querem serenidade e paz, querem brincar, ser amadas e sentirem-se seguras. Querem ver os pais felizes, andarem numa troca de tiros à sua frente. E isto, estes tiros, esta tensão permanente entre dois seres que se amaram um dia, tanto pode acontecer quer estejam casados, quer separados. E é com isto que a criança realmente sofre. Seja filho de pais casados, seja de pais separados. Não é a separação em si que causa traumas profundos na criança, mas sim a má gestão feita pelos adultos, que deviam ser os primeiros a proteger essas crianças. Claro que a separação dói mas são os actos irracionais de muitos pais que gera neles os traumas e o rótulo de coitadinhas.
 
Contei neste trabalho - eu e outras mães convidadas - que faço no Natal como tento fazer o ano inteiro, que a minha filha encare a quadra com alegria e normalidade e que não veja como drama o facto de ter uma festa em casa do pai e outra em casa da mãe. Contei, inclusive, que não vejo qualquer drama em que o pai ou a mãe passem o Natal juntos se as circunstâncias o permitirem. A minha filha chegou a ter esse exemplo quando num determinado ano o meu ex-marido ficou sozinho e eu, sem qualquer pingo de dúvida, lhe disse: "o pai da minha filha não fica sozinho, vais passar o Natal com ela e com a minha família". E assim foi.
 
 

quarta-feira, 30 de março de 2016

Carta de JC ao BE

Foi uma das últimas crónicas que escrevi na edição em papel do Diário Económico sobre o polémico cartaz do Bloco de Esquerda para assinalar a adopção por casais do mesmo sexo.

 
Transcrevo-a aqui do http://economico.sapo.pt/

Carta aberta de Jesus Cristo para o BE

Irmãos do BE, quero dizer-vos que achei alguma piada ao vosso cartaz. Só não ri à gargalhada porque achei que usaram o meu nome numa espécie de pirraça política e não para defender a causa das crianças e casais do mesmo sexo. Não era para vos escrever mas o meu pai, o Deus, e não o José, e a minha mãe pediram-me que o fizesse.
Meu Pai, o Deus, não o José, pede que vos diga que ficou muito sensibilizado por ter sido reconhecido por vossas excelências ao fim de tantos anos. Pediu-me que encarregasse João Baptista de descer à terra para os baptizar. A minha mãe, essa, é que ficou muito triste. Não percebe se foi excluída da minha origem no vosso cartaz porque estragava a analogia que pretendiam fazer ou porque tiveram vergonha de ela ter formado uma família não tradicional há mais de dois mil anos, engravidando de um e casando com outro. Eu expliquei-lhe que vocês iriam lembrar o seu papel na minha vida num próximo cartaz, quiçá sobre a bigamia.
Quanto a mim, queridos irmãos, não me senti ofendido. Só queria pedir-vos, e perdoem-me a ousadia, se no próximo cartaz poderiam usar uma foto minha mais recente, que terei todo o gosto em enviar para o partido. Não gostei muito da que usaram agora, mas achei de muito bom gosto terem escolhido o fundo cor-de-rosa. Um abraço irmão.

A azáfama do até já.

 
Agarra no saco, um maneirinho onde caiba tudo, e de coração apertado começa a arrumar, camada a camada, a roupinha do filho ou da filha, o cachecol porque faz frio (e que o pai não deverá tirar do saco), aquele casaco tão quentinho (que o pai vai esquecer a um canto), os ténis novos comprados naquelas lojas baratas de desporto, os cremes, não vá ela, a criança, ficar com o rabinho assado, o 'shampoo' próprio para a sua idade, as meias, as cuecas, ufa, ufa, ufa...As mães são tão chatas.

Está a chegar o dia, aquele dia em que eles vão para o pai. A barriga começa a dar sinais de revolução interna, as palpitações fazem das suas, ai que raio que eu não me habituo a isto.  Devia estar contente, e até estou, afinal vai para o pai, e se o pai é bom, nalguma escolha eu havia de acertar. E que bem que até me vai saber, que isto de ser mãe separada tem o que se lhe diga de desgastante. Há momentos em que atira-los pela janela - no meu caso atira-la - parece uma boa solução, tivéssemos nos a certeza que funciona como nos desenhos animados do Panda. Mas não funciona e por isso não há como fugir (nem queremos) das mais de 44 mil solicitações que estes pequenos seres nos apresentam.

Toca a correr para lhes enfiar goela abaixo manhã bem cedinho aquele batido de banana que os fortalece e tentar empurrar uma torrada, acabada de comer a caminho da escola. No regresso, já se pensa no jantar, naquelas calças que temos mesmos de lhes comprar, nas consultas médicas que estão por marcar, na reunião de pais com o professor. Imprimem-se testes no trabalho para os ajudar a acompanhar o frenesim em que anda a escola pública, cosem-se meias que insistem em abrir buraco no dedo gigante, enche-se a máquina de camisolas carregadas de nódoas feitas três minutos depois de as vestirem, fazemos de enfermeiras, cozinheiras, motoristas - vai para a ginástica, segue para os escoteiros e acaba no atletismo, para não falar das festas de aniversários dos amiguinhos -, de terapeutas, de massagistas, etc. etc. etc. Só de relatar me canso...e apenas conta 1/3 da realidade.
 
- Ó mãe, anda cá ver isto.
- Ó mãe, onde está a mochila?
- Ó mãe, apetece-me maçã.
- Ó mãe, porque é que trabalhas até tarde?
- Ó mãe, já viste o meu boneco.
- Ó mãe, não estás a olhar...
- Ó mãe, tens de vir aqui.
- Ó mãe, porque é que os meninos têm pilinha e nós não?
- Ó mãe, o João bateu-me.
- Ó mãe, caí.
- Ó mãe...
Ufa, ufa.

Está a chegar o dia de ir para o pai e eu muito cansada. Mas, então, porquê este golpe de Estado no peito, este vazio? É assim. Somos mães e uma mãe sente sempre um vazio quando o seu filho se encontra distante, mesmo que esteja bem. Porque desde que nasceram que se tornaram um nosso prolongamento. E leva muito tempo até que consigamos olhar para lá deles, para nós, de novo, como mulheres. Para aproveitarmos o tempo em que eles vão para o pai e arrancarmos do roupeiro aquele vestido bem giro e leva-lo a passear pela noite, ou para arrastarmos uma amiga (ou amigo, porque não?) para um bar lounge desses que estão na moda, ir ao cinema ou simplesmente alongarmos o corpo no sofá a ver aquele filme romântico que nos faz derramar uma lagrimita ou um daqueles de acção em que George Clonney nos leva a...bom, não digo!

Quando a porta bate e eles saem felizes a correr para o pai e nós desatamos num último fôlego a debitar recomendações que eles já nem ouvem, o vazio toma conta. E todo o cansaço que nem há dez minutos atrás estávamos a sentir esvai-se à velocidade de luz. E ficamos ali paradas, meio-tontas, sem saber o que fazer, sem nos apetecer levar o vestido giro a passear, ir ao cinema ou ao bar lounge. Só mesmo o sofá. Mas passa. Melhora. Com o tempo lá arrancamos o vestido do roupeiro, lá começamos a sair da toca. Se há parte boa numa separação é essa: termos a oportunidade de nos redescobrir como mulheres.
  

terça-feira, 29 de março de 2016

Separação sem armas

Quando me separei a minha filha andava pela idade da foto que  se segue. Era ainda pequena e  nossa principal preocupação, mesmo sem o dizermos, foi o bem-estar dela, que sentisse o menos possível os impactos da separação. Existe um facto do qual não os podemos poupar: a própria separação. E essa, só por si, já é para eles um fardo. Tudo o resto devemos evitar.
 

Já era uma menina feliz e continuou a ser, ainda que tivesse tido os seus altos e baixos, o seu tempo de adaptação. Foi crucial para isso a atitude que eu e pai tivemos, numa altura em que as emoções estão destrambelhadas. Mas é precisamente nesta altura que temos de ser PAIS.

Tivemos os nossos conflitos (quem não tem?) mas sempre ou quase sempre conseguimos - mais eu que ele - coloca-la à margem deles. Não digo que é fácil porque não é. Na altura, então, é muito difícil porque estamos em dor e com a autoestima ferida (ou será o ego?) e 'pensa-se' que o caminho mais fácil passa por dividir a dor com a criança. É o mais fácil mas é também o caminho errado minha gente. Difícil mesmo é semear a concórdia no meio da discórdia, ceder quando apetece responder à letra, relevar quando apetece reagir. Difícil é engolir sapos que nos parecem gigantes mas que, vá lá, admitam, vistas bem as coisas são bem mais pequenos que o amor que temos a obrigação de dar aos nossos filhos.

Viver a separação em guerra e levar a dor e o conflito até à criança surge-nos na hora (qual diabinho a tentar-nos) como o caminho mais fácil mas é também aquele que fará perdurar por muito tempo (quem sabe para sempre) a dor, a instabilidade, a desarmonia. Ah, pois é. Aguentar a dor da separação, promover a harmonia entre progenitor e criança, racionalizar o mais possível e deixar as crianças de fora de conflitos é o caminho mais difícil no imediato mas também é aquele que mais rapidamente nos conduz à paz e serenidade. E que, no fim, protege as nossas crianças. Como é possível que em pleno século XXI muitos pais ainda não tenham percebido esta equação e insistam em mostrar ao mundo que divórcio é sinónimo de conflito? Tenho uma resposta: o ego.
"Feliz aquele que supera o seu ego" (Buda).

Va lá malta adulta, gente que está a educar os homens e mulheres deste nosso belo país, deixem lá de usar os filhos num conflito pós-separação, deixem lá de transferir para eles as vossas dores e fracassos que aqueles pequeninos seres têm mais é de brincar (muiiiiito) de não de levar com esses actos de desamor. Não é fácil, mães é pais, não é nada fácil. Mas é possível. Eu fi-lo e conheço muitas mães e pais que o fizeram e fazem. É possível.

Vida em suspenso


Tenho a minha vida em suspenso.
A empresa para a qual trabalho, enquanto jornalista, como é por demais público, decidiu fechar (eles falam em suspender) a edição em papel do jornal. Isto depois de terem deixado de pagar salários ou de pagarem aos bocejos.

Sendo mãe divorciada que conta apenas com o seu salário para pagar aqui o castelo onde vive e as insistentes contas mensais que vão chegando (ainda tenho a esperança que um dia as empresas prestadoras de serviços se esqueçam de mim), optei muito antes da tão famigerada insolvência por pedir a suspensão do contrato. Ora, desde então, deixei de estar 'obrigada' a apresentar-me ao trabalho (é o que significa a suspensão) e, de jornalista/mãe que vivia numa tremenda correria, passei a jornalista/mãe com horas livres para inventar o que fazer. E invento, que lá nisso nem sou má.

Como a vida de jornalista/mãe num jornal diário (que vive da pressão e do inesperado) não me deixava tempo para outras tantas coisas que gosto e preciso, decidi que chegou o momento de partir para essas outras coisas. E voilá! já tenho uma plano para um novo estilo de vida, onde entram minutos (um dia passarão a horas) de ginástica (em casa e na rua que isto, sem salário, não está para ginásios), montanhas de cremes hidratantes (caseiros) para ver se fazem algum milagre aos efeitos da gravidade (ah, pois é), uma montanha de livros para pôr em dia, projectos para lançar (segredo!) e mais e mais, que vou tomando nota aos poucos.

Estar parada a lamentar-me e não aproveitar as crises como oportunidades não encaixa em  mim. Se a vida, em certo sentido, está em suspenso, temos de encontrar outros sentidos onde ela possa andar, quicá, até correr. Como dizia -  e bem - Winston Churchill "um pessimista vê uma dificuldade em cada oportunidade, um optimista vê uma oportunidade em cada dificuldade".

 No próximo dia 1 de Abril faz 18 anos que me estreei, como profissional, nesta aventura maravilhosa que é o jornalismo. Parece-me um bom dia para arrancar com este plano de dar luta a este maldito 'pneu'  que os 40 (e tais) me trouxeram e pôr o fim a alguns velhos e maus hábitos (ai...que difícil).  

Felicidade não é ser, é estar.

Parece que é desta.
Há muito que pessoas que me são queridas diziam para criar um blog e agora que a empresa para a qual trabalho está na situação que por todos é conhecida sobrou-me tempo para esta aventura. Quando, finalmente, disse que ia avançar a pergunta imediata foi: "E é sobre o quê?". Fiquei sem saber o que dizer. Porque nunca gostei muito de coisas estanques e pré-definidas. Sobre tudo o que eu quiser, era apenas a resposta que me ocorria. Sobre a actualidade, claro, porque sou jornalista e (muiiiito) interessada, sobre a monoparentalidade, porque sou mãe divorciada, sobre a inteligência emocional, porque adoro psicologia e cultivo este lado da existência, sobre a vida como ela é.

O único critério que tinha em mente é que não queria fazer um blog sobre vidas cor-de-rosa, onde tudo é belo, maravilhoso, bonito, super 'fashion', irreal, portanto. Porque a vida tem coisas menos boas, dilemas e zonas cinzentas, mas que podem ser vividas com optimismo. Mas que fique claro: é um blog pessoal. É a mulher e a mãe, sobretudo, que aqui estão. Só depois virá a jornalista.

É de tudo e de nada que me proponho falar. De como é possível aos 40 (e tais) mantermos uma vida saudável (ou tentar, vá lá), adorar roupas, sapatos e outras futilidades e ao mesmo tempo amar livros, informação, conhecimento, profundidade, espiritualidade. Quem disse que é incompatível? Aposto que anda por aí muita mente mais preconceituosa que acha que é. Mas não é. As mulheres já o provaram. É bem possível e bem saudável estar de manhã a espreitar o último gritos da moda numa galeria comercial, a babar pelas botas de salto agulha e camurça, e horas depois estar a fazer análise política ou social ou a ler um livro sobre o choque das civilizações ou a guerra no Médio Oriente. Olha que bom!

A vida é boa e ponto. Mesmo quando é madrasta (nada contra estas, atenção, apenas força de expressão). Divorciei-me há seis anos. E depois? O mundo não acabou, bem pelo contrário, recomeçou. Fiquei com um salário apenas para gerir uma casa e a vida, com uma filha pequena. Difícil, sim, mas possível. Não acerto nos 'castings' a parceiros amorosos. Aqui, confesso, é chato e irritante...mas também enriquecedor (ahahah!, eu a rir de mim própria). Não faço a vida que os nossos avós e pais dizem ser a 'normal' ou a 'tradicional'. Acho isso óptimo. Começo a sentir os efeitos da gravidade numa cabeça que ainda tem 30 anos. Pois...é chato...mas tem solução (a iludir-me de novo). E por aí adiante...a felicidade não está no 'ser' mas sim no 'estar'. Não ambiciono ser feliz. Quero estar feliz. E o estar é hoje, é agora.